quinta-feira, 5 de novembro de 2015

RIO DO DOCE (IMPRESSÕES DE UMA ÉPOCA – PRIMÓRDIOS DO SÉCULO XX)

Em Minas Gerais está não só a maior, como a mais rica porção da bacia hidrográfica do Rio Doce, com as jazidas minerais, as cachoeiras, seus mais poderosos e numerosos rios tributários, as mais importantes cidades. Para o Espírito Santo, que ele corta em duas metades (uma ao norte, outra ao sul), o rio tem uma relevância vital, que não foi ainda devidamente explorada e que, ao contrário, se vem depreciando a cada ano.

Como cidades mais importantes na bacia, podemos citar: Ponte Nova, Viçosa, Guanhães, Alto Rio Doce, Presidente Vargas (antiga Itabira), Manhuaçu, Mariana, Ouro Preto, Ferros, Caratinga, Aimorés, Colatina, Linhares, Governador Valadares.

Dos rios tributários, o mais importante é o Rio Piracicaba, particularmente pela grande atração das montanhas de minério de ferro e manganês. Ali, nas cabeceiras do Rio do Peixe, afluente da margem esquerda do Piracicaba, está a famosa cidade de Itabira, onde se encontra o minério de ferro abundante, da melhor qualidade e elevado teor metálico.

Mas à grandeza do Rio Doce faltou um elemento primordial: tivesse ele tido a ventura de atrair a si uma ferrovia, liderada por acentuado espírito público e uma larga visão de progresso, como nas outras regiões mais ditosas, e o Rio Doce de hoje seria o que todos aspiramos que ele fosse – algo de grandioso.

Só duas atividades foram planejadas no Rio Doce: primeiro a Estrada de Ferro Vitória a Minas, depois a extração do minério. Nenhuma delas beneficiou ainda a terra, ou o homem da bacia do Rio Doce; isso porque não houve um planejamento em que se cogitasse para primeiro plano a terra ou homem desta bacia.

Depois da Primeira Guerra Mundial, os desajustamentos decorrentes do desequilíbrio econômico do pós-guerra forçaram a organização da extração do minério em larga escala, algumas cidade interessaram-se pelo aproveitamento das sobras das atividades dela decorrentes, mas só nas imediações das jazidas em exploração, na parte alta da bacia.

Exploraram-se as reservas naturais da região para solucionar o problema econômico nacional. Mas é preciso não esquecer que a região geográfica que tão fortemente contribui para o conjunto, tem o direito de ser beneficiada com uma parcela do que ela produz, que a ele deve reverter transformada em possibilidade de progresso, em benefícios de civilização e de cultura, uma parcela da produção bruto que dela sai para objetivos da coletividade brasileira.

O Rio Doce, no início do século XX, era para o brasileiro um rincão lendário e não localizado. Terra de ninguém. Pela margem sul, esgueirava-se uma ferrovia, imprensada entre a faixa lisa e barrenta do rio e as encostas sulcadas pelos cortes, por vezes entre dois muros de gnaisse, na tentativa quase inútil, por que simulada, de levar civilização, só animada na realidade pelo incentivo tentador de alcançar para capitais estrangeiros as montanhas de minério de Itabira.

Na riqueza daquele caminho líquido desprezado, numa região onde não havia estradas pela dificuldade de construí-las, que poderia ser aproveitado, ao menos por trechos, e que só trazia à sofredora população marginal os prejuízos das enchentes e o perigo dos mosquitos da febre, nas vazantes.





REFERÊNCIA

MIRANDA, Salm. Rio Doce (Impressões de uma época). Rio de janeiro: Biblioteca do Exército. 1949.

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